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Novo centro da USP pretende combinar pesquisa em saúde mental com atendimento digital à população

José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – O Centro Nacional de Pesquisa e Inovação em Saúde Mental (CISM) foi lançado oficialmente em evento realizado na última quarta-feira (15/03), no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FM-USP).

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Iniciativa conjunta do Departamento de Psiquiatria da FM-USP e da FAPESP, o CISM deverá combinar atividades de pesquisa, buscando os fatores que originam e precipitam os transtornos mentais, com o desenvolvimento de intervenções digitais que possam promover a saúde mental da população de forma mais inovadora e escalável. Além disso, se propõe a estudar a implementação de intervenções comprovadamente efetivas no Sistema Único de Saúde (SUS), de modo a garantir que o conhecimento gerado pela ciência em saúde mental se traduza em benefícios reais à população.

Reunindo pesquisadores das faculdades de medicina da USP, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), as mais produtivas em saúde mental da América Latina, o CISM já conta com um expressivo leque de parcerias ou assessorias internacionais, entre elas as das universidades Harvard e Yale, nos Estados Unidos.

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Além do substancial aporte financeiro provido pela FAPESP, sua criação contou com recursos do Banco Industrial do Brasil (BIB). No âmbito da FAPESP, o CISM ficará alocado entre os Centros de Pesquisa em Engenharia/Centros de Pesquisa Aplicada (CPEs/CPAs) mantidos pela Fundação.

Em apresentação feita durante o evento, Eurípedes Constantino Miguel Filho, vice-chefe do Departamento de Psiquiatria da FM-USP e coordenador do projeto, informou com mais detalhes como serão os três eixos estruturantes do CISM.

“No Eixo 1, ‘Neurociência Populacional’, teremos um estudo de coorte [acompanhamento de um grupo de voluntários] que buscará identificar os fatores de risco importantes na origem dos transtornos mentais. No Eixo 2, ‘Intervenções Digitais’, queremos criar um ambiente de inovação em que identificamos as necessidades da população em saúde mental e partimos para a prototipagem e desenvolvimento de aplicativos que possam dar conta destes problemas, sendo devidamente testados do ponto de vista de sua eficácia clínica. No Eixo 3, ‘Ciência da Implementação’, pretendemos implementar intervenções baseadas em evidências no Sistema Único de Saúde de duas cidades do Estado de São Paulo, Jaguariúna e Indaiatuba. O objetivo final é oferecer soluções testadas para serem disseminadas pelo país e adotadas como políticas públicas”, disse.

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Referência internacional

A expectativa é que o modelo do CISM não apenas extrapole as fronteiras paulistas, podendo motivar iniciativas semelhantes em outros Estados brasileiros, mas também se torne uma referência internacional, principalmente, mas não apenas, para países de baixa e média rendas per capita.

Miguel Filho lembrou que os transtornos mentais afetam cerca de 30% da população na megalópole de São Paulo. Esse número foi levantado por uma pesquisa realizada há mais de dez anos, mas que continua referencial na área (leia mais em: agencia.fapesp.br/15215/).

“Além disso, entre todas as condições médicas, os transtornos mentais se destacam por representar uma grande carga de doença para a população, por serem frequentes, iniciarem cedo na vida e causarem incapacidade e sofrimento”, ressaltou.

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Um dado quase sempre ignorado é que os transtornos mentais têm início precoce, tendo seu pico de incidência entre os 14 e 15 anos de idade. Por outro lado, o acesso ao tratamento é limitado. Estudo que utilizou uma base de dados de mais de 60 mil indivíduos no Brasil mostrou que, por ocasião do levantamento, apenas 20% das pessoas com depressão haviam recebido algum tipo de tratamento. E que uma porcentagem importante da população mais vulnerável não estava recebendo ajuda. Esses números sobrelevam a importância do CISM para o sistema de saúde brasileiro.

Na sequência da apresentação, Luis Augusto Rohde, professor titular do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal da UFRGS, desenvolveu o tema das tecnologias digitais em saúde mental, contemplado pelo Eixo 2. E afirmou que, embora os aplicativos dedicados à saúde mental tenham explodido no mercado, apenas 2% deles são respaldados por pesquisas. “Além disso, 90% dos usuários abandonam os aplicativos em um prazo de dez dias”, disse.

A proposta de criação do “Hub Saúde Mental Digital” visa superar esse quadro, tornando-se um centro de referência nacional para incubação e aceleração de soluções digitais inovadoras em saúde mental. E, em parceria com o INOVA-HC (núcleo de inovação tecnológica do hospital), estabelecer um centro de acreditação para soluções digitais inovadoras em saúde mental.

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O detalhamento do Eixo 3 foi feito por Paulo Rossi Menezes, professor titular do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP). Ele informou que aproximadamente 50% das intervenções médicas que têm eficácia cientificamente comprovada não chegam à prática clínica. E que o tempo médio necessário para a implementação gira em torno de 20 anos. Ou seja, não basta produzir conhecimento de qualidade, é preciso saber como colocá-lo em prática – o que torna a própria implementação uma ciência.

Além de Miguel Filho, Rohde e Menezes, a coordenação do CISM conta com a participação de Jair de Jesus Mari, professor titular do Departamento de Psiquiatria da Unifesp.

No evento de lançamento, entre várias autoridades, estiveram presentes Vahan Agopyan, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo; Carlos Gilberto Carlotti Júnior, reitor da USP; Eloisa de Oliveira Bonfá, diretora da FM-USP; Carlos Alberto Mansur, CEO do BIB; Marco Antonio Zago, presidente do Conselho Superior da FAPESP; e Luiz Eugênio Mello, diretor científico da Fundação.

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Zago contou que a proposta original do CISM, que vinha com a doação privada do BIB, não correspondia exatamente ao modelo dos CPEs/CPAs, que é hoje o maior programa de cooperação entre universidades e empresas do Brasil, com um investimento de R$ 1,5 bilhão.

“O professor Luiz Eugênio Mello trabalhou intensamente, junto com o Carlos Américo Pacheco, diretor-presidente da FAPESP, para formatar esse centro que estamos lançando aqui agora. E é isso que eu quero comemorar, a capacidade de nossos diferentes atores de obter os resultados que importam para a sociedade”, sublinhou Zago.

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Pesquisadores da USP criam sensor de baixo custo que detecta metais pesados no suor

Julia Moióli | Agência FAPESP – Metais pesados, como chumbo e cádmio, estão presentes em ambientes e itens utilizados no dia a dia, como baterias, produtos de beleza e até alimentos. Por serem tóxicos, seu efeito cumulativo no organismo pode causar uma série de problemas para a saúde. E para detectá-los em fluidos corporais são necessários instrumentos analíticos caros e ambiente controlado para testes. Como alternativa, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram, com materiais simples, um sensor portátil capaz de verificar a presença desses elementos no suor, cuja amostra pode ser facilmente obtida.

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O estudo apoiado pela FAPESP (projetos 16/01919-6 e 16/06612-6) envolveu grupos dos institutos de Física (IFSC) e de Química (IQSC) do campus de São Carlos, além de colaboradores da Universidade de Munique (Alemanha) e da Chalmers University of Technology (Suécia). Os resultados foram divulgados na revista Chemosensors.

“Determinar a exposição a metais pesados pode oferecer informações importantes sobre a saúde de uma pessoa: altos níveis de cádmio podem levar a problemas fatais no trato respiratório, fígado e rins; enquanto a intoxicação por chumbo pode retardar o crescimento e o desenvolvimento, além de causar irritabilidade, aumento de comportamento violento, dificuldades de aprendizagem, fadiga, perda de memória e apetite, infertilidade, pressão alta, perda auditiva em crianças e declínio no funcionamento mental em adultos”, afirma Paulo Augusto Raymundo Pereira, idealizador do trabalho e pesquisador do IFSC-USP.

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Segundo o pesquisador, esses metais são eliminados do organismo principalmente pelo suor e pela urina. A análise desses fluidos corporais, portanto, pode auxiliar em estudos toxicológicos e terapêuticos.

“Dessa forma, o design e a fabricação de sensores flexíveis usando métodos de prototipagem fáceis, baratos e rápidos para produção em larga escala, como é o caso do nosso dispositivo, são fundamentais para o monitoramento e a detecção in loco do estado de saúde dos indivíduos, em análises descentralizadas.”

Ao contrário de outras técnicas padrão-ouro para detectar metais pesados em fluidos biológicos, todos os materiais e as etapas de produção do sensor da USP são simples.

“Feito sobre polietileno tereftalato [PET], o dispositivo utiliza uma fita adesiva condutora de cobre flexível e uma etiqueta de papelaria que contém o desenho dos sensores, além de esmalte de unhas ou spray como camada protetora. Para remover o cobre exposto, é realizada uma imersão em solução concentrada de cloreto férrico por 20 minutos, seguida de lavagem com água, o que promove a corrosão necessária. Tudo isso se traduz em maiores velocidade e escalabilidade, com baixos consumo de energia e custo”, detalha Robson R. da Silva, pesquisador da Chalmers University of Technology e coautor da pesquisa.

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Depois de pronto, o dispositivo é conectado a um instrumento portátil chamado potenciostato, que executa a análise por meio de um potencial aplicado que produz uma corrente elétrica proporcional à concentração de cada metal. O resultado é obtido em um aplicativo, que pode ser instalado em equipamentos eletrônicos como notebooks, tablets ou smartphones.

Por sua simplicidade, pode ser manuseado tanto por analistas quanto por pessoas não especializadas ou treinadas, em ambientes de saúde como postos, hospitais e consultórios. Outra vantagem é que seu uso pode ser estendido para outras áreas, como a ambiental.

“Poços artesianos, por exemplo, são regulamentados e precisam passar por análise de metal. Nosso sensor poderia ser extremamente útil nesses casos”, afirma Anderson M. de Campos, pesquisador da Universidade de Munique e integrante da equipe.

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Melhorias e possível patente

O desempenho do sensor na detecção de chumbo e cádmio foi avaliado em estudos feitos com amostras de suor artificial enriquecido sob condições experimentais ideais. Porém, ainda são necessárias adaptações para que o dispositivo possa ser patenteado.

“Até a finalização desta invenção, não encontramos nenhum relato sobre o uso de sensores flexíveis de cobre para detecção de metais tóxicos no suor, mas uma busca de anterioridade provavelmente deve encontrar algo semelhante, o que dificultaria nosso processo”, diz o pesquisador do IQSC-USP Marcelo L. Calegaro, coautor da pesquisa.

Para ultrapassar essa barreira, o cientista trabalha em melhorias e na expansão de aplicação. Uma das ideias é substituir a etapa de corrosão, que gera detritos e resíduos, pelo corte em uma máquina de papel. Outra é utilizar o mesmo desenho de sistema para detectar também pesticidas na água e em alimentos, por exemplo.

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O artigo Design and Fabrication of Flexible Copper Sensor Decorated with Bismuth Micro/Nanodentrites to Detect Lead and Cadmium in Noninvasive Samples of Sweat pode ser lido em: www.mdpi.com/2227-9040/10/11/446.

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Estudo relaciona alteração de olfato ou paladar após a COVID-19 com problemas de memória

Pesquisadores da USP acompanharam 701 pacientes internados por complicações da doença no Hospital das Clínicas. Em avaliações feitas seis meses após a alta hospitalar, observou-se que os indivíduos que apresentavam mais sequelas sensoriais também tinham pior desempenho nos testes cognitivos, principalmente os de memorização

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Karina Toledo | Agência FAPESP – Estudos feitos antes da pandemia de COVID-19 apontaram a perda de olfato como um possível sinal precoce da doença de Alzheimer. Há, na literatura científica, evidências de que essa disfunção sensorial pode se manifestar anos antes dos primeiros sintomas cognitivos aparecerem, o que sugere haver uma conexão entre a região cerebral responsável pela memória e a que registra e interpreta os estímulos olfativos.

Essa hipótese acaba de ganhar força com um trabalho publicado por pesquisadores brasileiros no European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience. O grupo acompanhou 701 pacientes internados com COVID-19 moderada ou grave no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), entre março e agosto de 2020. Em avaliações feitas seis meses após a alta hospitalar, observaram que os indivíduos que apresentavam mais sequelas sensoriais pós-COVID (redução ou modificação do olfato e/ou do paladar) tinham pior desempenho nos testes cognitivos, particularmente nos de memória. E esse resultado era independente de quão grave havia sido o quadro na fase aguda da doença.

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“O olfato é uma importante conexão com o mundo externo e está muito relacionado com experiências passadas. O cheiro de bolo, por exemplo, pode nos trazer a lembrança da avó. Em termos de conexão cerebral, tem uma interação com a memória muito mais robusta do que a visão e a audição”, afirma o médico otorrinolaringologista Fábio Pinna, um dos autores do artigo.

Dos 701 voluntários incluídos na pesquisa, 52,4% eram do sexo masculino. A média de idade foi de 55,3 anos e o tempo médio de internação de 17,6 dias. Pouco mais da metade da amostra (56,4%) precisou ser internada em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) por complicações da COVID-19, sendo que 37,4% dos voluntários foram intubados.

Nas análises conduzidas seis meses após deixarem o hospital, o funcionamento do olfato e do paladar foi mensurado por meio de questionários previamente padronizados para estudos do tipo, que também avaliam aspectos relacionados à qualidade de vida.

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A redução moderada ou severa do paladar foi a sequela sensorial mais comum (20%), seguida de redução de olfato moderada ou severa (18%), redução concomitante de olfato e paladar moderada ou severa (11%) e parosmia (9%) – termo usado para descrever alterações na percepção olfativa, por exemplo, quando um odor antes considerado agradável passa a ser percebido como ruim. Doze voluntários apresentaram alucinações olfativas (sentem cheiros que outras pessoas não sentem) e nove pessoas relataram alucinações gustativas (sentem o gosto de um alimento sem tê-lo provado). Nos dois casos, a maioria afirmou que essas alucinações só apareceram após a infecção pelo novo coronavírus. Em relação ao estado geral de saúde, 10,1% dos participantes descreveram como “ruim ou muito ruim”, 38,5% como “médio” e 51,4% como “bom ou muito bom”.

Também por meio de questionários padronizados, os cientistas verificaram a presença de sintomas psiquiátricos, como ansiedade e depressão. E testes neuropsicológicos foram aplicados para mensurar as chamadas funções cognitivas, entre elas memória, atenção e velocidade de raciocínio.

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Ao final, todos os resultados foram analisados por métodos estatísticos com o objetivo de descobrir se havia uma correlação entre sintomas neuropsiquiátricos e disfunções sensoriais. Observou-se que os voluntários que sofriam de parosmia tinham maior percepção de que sua memória estava ruim. Aqueles que tiveram diminuição moderada ou grave do paladar saíram-se significativamente pior em uma tarefa que consistia em memorizar uma lista de palavras – usada para avaliar a chamada memória episódica (de curto prazo, muito relacionada com a atenção). Os voluntários que tiveram perda concomitante de paladar e olfato moderada ou grave também demonstraram comprometimento significativo na memória episódica.

“Não encontramos nenhum sintoma psiquiátrico [ansiedade ou depressão, por exemplo] associado à perda de olfato e paladar. Mas, como esperado, observamos que a atenção e a memória episódica estavam mais prejudicadas nos pacientes com maior alteração quimiossensorial”, comenta Rodolfo Damiano, doutorando na FM-USP com bolsa da FAPESP e primeiro autor do artigo. “Esse achado corrobora a hipótese de que a COVID-19 tem, de fato, um impacto na cognição e seus prejuízos não são apenas decorrentes de questões psicossociais ou ambientais”, avalia.

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A origem do dano

No caso da doença de Alzheimer, acredita-se que a perda de olfato possa ser uma das primeiras consequências do processo degenerativo que leva à perda progressiva de neurônios. Já a perda de olfato associada à COVID-19, segundo Pinna, é decorrente da inflamação desencadeada pelo SARS-CoV-2 na mucosa olfatória. “Isso leva a uma diminuição do muco olfatório. Não temos visto uma lesão direta nos neurônios olfatórios. Eles acabam se degenerando, mas parece ser uma consequência secundária da perda do muco olfatório. A mucosa sofre um processo de atrofia e pode perder essa capacidade de captar odores”, explica o médico.

Como explica o psicogeriatra Orestes Forlenza, professor do Departamento de Psiquiatria da FM-USP e um dos coordenadores do estudo, as perdas cognitivas observadas na doença de Alzheimer e nas síndromes pós-COVID decorrem de processos patogênicos distintos, mas os dois processos podem se sobrepor. “Particularmente em indivíduos idosos, que já apresentam sintomas cognitivos primários e venham a contrair a infecção. Há indícios preliminares de que essa sobreposição de fatores patogênicos possa acelerar ou agravar a progressão das perdas cognitivas”, afirma.

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Ainda não se sabe, contudo, o mecanismo exato pelo qual a infecção pelo coronavírus leva ao dano cognitivo. Para tentar identificar quais vias cerebrais estão alteradas na fase aguda da doença, o grupo da USP pretende aplicar novos testes em pacientes que apresentam perda de olfato e paladar. A ideia é que os voluntários façam as tarefas enquanto são submetidos a um exame de ressonância magnética de 7 tesla, que tem imagem de altíssima resolução (os equipamentos comuns têm apenas 3 tesla).

“Nossa hipótese é a de que o vírus provoca uma neuroinflamação, que leva ao prejuízo na cognição. Se os danos são permanentes ainda não sabemos. Continuamos a acompanhar os pacientes para descobrir se há melhora ou não”, conta Damiano.

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O grupo também pretende investigar se a relação entre perda sensorial e cognitiva também ocorre em pessoas que contraíram a COVID-19 após a vacinação. “Estamos fazendo um estudo semelhante a este agora divulgado, mas considerando se o participante foi ou não vacinado e quantas doses tomou antes de se infectar. O objetivo é descobrir se a vacina oferece proteção contra complicações neuropsiquiátricas. E também se um tipo de imunizante protege mais que outro, o que o tornaria mais indicado para pessoas com doenças psiquiátricas”, conta o doutorando.

Mais atenção ao olfato

Segundo os autores, uma das mensagens importantes do artigo é que disfunções olfativas deveriam ganhar mais atenção de profissionais de saúde e das pessoas em geral.

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“Quando um idoso começa a perder o olfato, pode ser um indício precoce de demência. É preciso levá-lo ao médico para uma avaliação. Já as pessoas que tiveram perda olfativa moderada ou grave após a COVID-19 devem ficar atentas nos próximos anos a alterações de memória, assim como seus familiares”, opina Damiano.

Pinna espera que os resultados estimulem médicos e pacientes com disfunção olfatória a investir no tratamento. “Antes da COVID-19 esse problema era ignorado. Os tratamentos eram pouco conhecidos, se acreditava que não havia muito o que fazer. Hoje há evidências de que é importante tratar para minimizar tanto a perda de qualidade de vida causada pela disfunção sensorial em si como para prevenir outros problemas de saúde associados. Temos um incentivo para não desistir do tratamento”, diz.

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O artigo Association between chemosensory impairment with neuropsychiatric morbidity in post acute COVID 19 syndrome: results from a multidisciplinary cohort study pode ser lido em: https://link.springer.com/content/pdf/10.1007/s00406-022-01427-3.pdf.

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Novos compostos descobertos em esponja-do-mar têm efeito contra bactérias resistentes

Em espécie encontrada no arquipélago de Fernando de Noronha, pesquisadores da USP identificaram substâncias inéditas, que se mostraram capazes de eliminar bactérias resistentes a antibióticos. Trabalho foi descrito no Journal of Natural Products

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André Julião | Agência FAPESP – Um grupo liderado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, identificou uma série de compostos bioativos em uma esponja marinha coletada no arquipélago de Fernando de Noronha, em Pernambuco. Algumas substâncias se mostraram capazes de matar bactérias resistentes aos antibióticos atualmente disponíveis, o que abre caminho para o desenvolvimento de novos fármacos.

O estudo, apoiado pela FAPESP, foi publicado no Journal of Natural Products.

“Essa esponja marinha já havia sido estudada anteriormente por grupos do exterior, principalmente nos anos 1990. Utilizamos, então, técnicas modernas para avaliar as substâncias do seu metabolismo secundário, buscar novas moléculas e testar sua atividade biológica. Conseguimos descrever uma série de novos compostos. O maior potencial encontrado foi contra bactérias resistentes aos antibióticos atuais”, conta Vítor Freire, que realizou o estudo como parte do seu doutorado no Instituto de Química de São Carlos (IQSC-USP).

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A resistência a antibióticos é considerada um dos maiores problemas de saúde pública global pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo relatório encomendado pelo governo britânico, publicado em 2016, as mortes causadas por infecções de bactérias resistentes devem atingir 10 milhões de pessoas por ano em 2050. Daí a importância de se descobrir novos antibióticos eficazes.

A esponja marinha da espécie Agelas dispar ocorre no Caribe e em parte do litoral brasileiro. Por serem alguns dos organismos há mais tempo na Terra e viverem fixas no substrato marinho, ao longo de milhões de anos as esponjas-do-mar desenvolveram um complexo metabolismo, produzindo substâncias essenciais para a competição com outros invertebrados e para evitar infecções por bactérias patogênicas.

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No estudo publicado agora, as substâncias com maior potencial terapêutico foram três diferentes tipos de ageliferinas, nome advindo do gênero da esponja-do-mar Agelas.

“Outro fator importante é a capacidade das esponjas de armazenar substâncias de microrganismos simbiontes, que também as ajudam a se defender. Por isso, quando analisamos os compostos encontrados nesses animais, nem sempre dá para saber o que foi produzido por eles e o que é produto de sua microbiota”, explica Roberto Berlinck, professor do IQSC-USP e coordenador do estudo.

O trabalho integra dois projetos (19/17721-9 e 13/50228-8) coordenados por Berlinck e financiados pela FAPESP. Um deles integra o Programa BIOTA-FAPESP.

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Tumores e bactérias

Treze compostos foram testados em uma linhagem de células tumorais de ovário conhecida como OVCAR3, mas não apresentaram atividade biológica. Outros grupos já haviam testado as ageliferinas em tumores de pulmão, cólon e mama. Nos trabalhos anteriores, também não foi observada ação antitumoral.

Três substâncias, porém, foram eficazes na eliminação de bactérias resistentes a antibióticos. Essa parte do estudo foi feita no Instituto Adolpho Lutz (IAL), sob coordenação do pesquisador André Gustavo Tempone, também apoiado pela FAPESP.

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Foram submetidas a esses compostos seis espécies, sendo duas delas Escherichia coli e Enterococcus faecalis, algumas das mais comuns e encontradas em diferentes ambientes, inclusive no corpo humano.

As outras quatro bactérias são listadas pela OMS como prioritárias para o desenvolvimento de novos antibióticos: Staphylococcus aureusKlebsiella pneumoniaeAcinetobacter baumannii e Pseudomonas aeruginosa. Essas são algumas das responsáveis pela maior parte das infecções hospitalares, por serem capazes de escapar da ação dos antibióticos disponíveis no mercado.

Os pesquisadores queriam saber, porém, se o uso das ageliferinas poderia levar à hemólise dos glóbulos vermelhos do intestino, um efeito adverso comum em pacientes submetidos a tratamento quimioterápico que precisam de antibióticos e que pode levar à morte. Em células de camundongos, os compostos não causaram danos. Tal resultado indica um bom potencial para o desenvolvimento de novos fármacos.

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O objetivo do grupo, agora, é analisar outras esponjas marinhas com a mesma metodologia utilizada para descobrir os novos compostos. “Investigar como essas substâncias são produzidas é extremamente importante, uma vez que elas são distribuídas por algumas classes de esponjas e podem futuramente ajudar a tratar doenças”, encerra Freire, que atualmente faz pós-doutorado no National Cancer Institute, nos Estados Unidos.

O trabalho teve ainda apoio da FAPESP por meio de bolsas de pós-doutorado para Juliana Gubiani no IQSC-USP (17/06014-4) e para Erica de Castro Levatti no IAL (20/03637-3).

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O artigo Feature-Based Molecular Networking Discovery of Bromopyrrole Alkaloids from the Marine Sponge Agelas dispar pode ser lido em: https://pubs.acs.org/doi/10.1021/acs.jnatprod.2c00094.

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Falta de vitamina D na gestação pode afetar o desenvolvimento muscular dos descendentes, sugere estudo

Por meio de experimentos com ratos, pesquisadores da USP descobriram que a deficiência materna do nutriente causa atrofia em fibras musculares da prole masculina, embora o tecido consiga se adaptar na vida adulta. Por motivos ainda desconhecidos, as fêmeas não são prejudicadas

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Luciana Constantino | Agência FAPESP – A falta de vitamina D durante a gestação está ligada ao desenvolvimento de uma série de doenças na fase adulta – desde problemas de crescimento até diabetes, obesidade e esclerose múltipla. Agora, uma pesquisa realizada na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) mostrou que esse nutriente também é fundamental para o crescimento e o desenvolvimento dos músculos ao longo da vida.

Por meio de experimentos com ratos, o grupo de cientistas concluiu que a deficiência de vitamina D materna afeta seletivamente o desenvolvimento de fibras musculares do tipo 2 (o chamado músculo branco) nos filhotes machos. Essas fibras atrofiaram mais durante o período juvenil (prole com 21 dias). Ao longo da vida do animal, porém, elas conseguem se recuperar e se adaptar à deficiência. Isso porque o próprio músculo é capaz de produzir a vitamina D na vida adulta.

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Nutriente obtido por meio da alimentação, mas principalmente sintetizado pelo organismo humano após exposição à radiação solar, a vitamina D é um hormônio que atua na saúde óssea, no crescimento, na imunidade e no metabolismo. Na literatura científica há poucos dados sobre seus efeitos nos músculos.

O que intrigou os pesquisadores e demandará mais estudos é o motivo de a prole fêmea ter sido protegida das alterações induzidas pela deficiência materna. Uma das hipóteses é que a proteção esteja ligada a algum hormônio, como o estrogênio, ou a algo na placenta.

O trabalho faz parte de um Projeto Temático da FAPESP e foi publicado no Journal of Cachexia, Sarcopenia and Muscle. É resultado do trabalho de doutorado da biomédica Natany Garcia Reis.

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“A descoberta de que o músculo do animal adulto deficiente é capaz de compensar a deficiência endógena de hormônio circulante aumentando sua produção interna, para mim, como fisiologista, é muito gratificante porque abre um campo de pesquisa enorme. Podemos avaliar, por exemplo, se o exercício físico estimula esse sistema”, explica Luiz Carlos Navegantes, professor do Departamento de Fisiologia da FMRP-USP e autor correspondente do artigo.

Segundo Navegantes, os resultados obtidos trazem mensagens relevantes, que reforçam a importância da vitamina D durante a gestação e a lactação. “Trazemos um novo olhar clínico, destacando a importância fisiológica do hormônio não só para os ossos, mas chamando a atenção para a força muscular”, completa.

Precedente

Os cientistas da FMRP-USP usaram como um dos pontos iniciais para o estudo o conceito de que doenças em pacientes adultos podem ter origem no período fetal.

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Ratas fêmeas foram alimentadas com uma dieta normal ou uma dieta sem vitamina D durante seis semanas e, na sequência, durante todo o período de gestação e lactação. No desmame, os filhotes machos e fêmeas foram separados e receberam dieta padrão até os 180 dias de idade.

A deficiência de vitamina D induziu atrofia muscular na prole masculina ao final do desmame, efeito revertido ao longo do tempo. Após 180 dias, os músculos esqueléticos de contração rápida (brancos) mostraram uma diminuição no número de fibras totais, mas aumento do tamanho das fibras (hipertrofia), enquanto os músculos de contração lenta (vermelhos) apresentaram grande prejuízo da força muscular, sem alterações morfológicas aparentes.

A hipertrofia das fibras brancas foi associada aos maiores níveis proteicos de MyoD e miogenina (fatores envolvidos na coordenação do desenvolvimento e reparação do músculo esquelético). Por razões desconhecidas, a maioria das alterações morfológicas e bioquímicas não foi observada no tecido musculoesquelético das fêmeas.

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Navegantes destaca que havia estudos realizados com porcos mostrando evidências de que a suplementação materna com vitamina D promovia crescimento muscular. “Partimos dessas informações para avançar na pesquisa. Agora temos alunos avaliando os efeitos no coração, no pâncreas e em outros órgãos. Também vamos analisar como se comporta em prole castrada para tentar entender a proteção para as fêmeas”, diz o professor.

Em 2020, outro trabalho do grupo coordenado por Navegantes e pela professora Isis do Carmo Kettelhut, também da FMRP-USP, demonstrou, pela primeira vez, que estimular a expressão de uma proteína naturalmente produzida pelo corpo humano pode ser uma estratégia para combater a perda de massa muscular. Esse processo natural do envelhecimento pode ser intensificado em casos de doenças neurodegenerativas, inflamatórias ou de indivíduos que precisam passar longos períodos internados em Unidades de Terapia Intensiva (leia mais em: agencia.fapesp.br/34302/).

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O artigo Maternal vitamin D deficiency affects the morphology and function of glycolytic muscle in adult offspring rats pode ser lido em: https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1002/jcsm.12986.

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Cientistas identificam na Bahia espécie de besouro que participa da produção da própolis vermelha

Nova espécie da família Buprestidae foi descrita por pesquisadores da USP e colaboradores. Grupo desvendou como o inseto contribui para a fabricação desse tipo de própolis pelas abelhas

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Thais Szegö | Agência FAPESP – Foi em uma viagem para Canavieiras, na Bahia, que Jairo Kenupp Bastos, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FCFRP-USP), ouviu falar pela primeira vez sobre o inseto. “Os apicultores da região me contaram sobre um bichinho que faz furos em uma planta chamada Dalbergia ecastaphyllum, um tipo de leguminosa, de onde sai uma resina que serve de matéria-prima para a fabricação da própolis vermelha”, conta.

Essa resina é capturada pelas abelhas Apis mellifera, combinada com cera, pólen e enzimas, dando origem a esse tipo de própolis – o segundo mais produzido e comercializado no Brasil. Ela tem essa cor exatamente por causa da substância obtida na planta e possui propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias e antitumorais.

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Para entender melhor como esse processo acontece, Bastos levou algumas larvas do besouro para o Museu de Zoologia da USP, na capital paulista. Mas para identificar corretamente o inseto era preciso capturar espécimes adultos. A doutoranda Letizia Migliore ficou encarregada dessa missão e, acompanhada do entomologista Gianfranco Curletti, do Museo Civico di Storia Naturale em Carmagnola, na Itália, do pós-doutorando Gari Ccana-Ccapatinta, da FCFRP-USP, e do biólogo e apicultor Jean Carvalho, morador de Canavieiras, fez várias saídas de campo na cidade baiana para procurar os insetos nos galhos da planta.

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“Como eles são muito pequenos, não foi uma tarefa fácil, mas conseguimos coletar alguns machos e fêmeas que foram conservados em álcool 70° GL e levados ao museu, onde foram analisados no microscópio. Assim foi possível a descoberta dessa nova espécie da família Buprestidae, que recebeu o nome de Agrilus propolis”, conta Migliore. O trabalho contou com a participação de Curletti, Gabriel Biffi e Sônia Casari, chefe do laboratório de Coleoptera do Museu de Zoologia e orientadora de Migliore.

“Em paralelo a isso, análises fitoquímicas foram realizadas no laboratório de farmacognosia [da FCFRP-USP] para confirmar que a composição química da resina e a da própolis é a mesma, comprovando, assim, a sua origem botânica e a participação dessa nova espécie de besouro na produção da substância medicinal”, conta Ccana-Ccapatinta, integrante da equipe de Bastos.

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Transformação

A união das pesquisas dos dois grupos também possibilitou entender como o processo acontece. As larvas do inseto se desenvolvem no interior do caule da Dalbergia ecastaphyllum, popularmente conhecida como rabo-de-bugio ou marmelo-do-mangue, e, quando o ciclo de vida dos insetos se completa, os adultos saem da planta através de pequenos orifícios por onde vaza a resina ou o exsudato, nome científico para líquidos orgânicos que extravasam através das membranas celulares de plantas ou animais por causa de lesões.

As descobertas obtidas pela pesquisa foram publicadas no periódico The Science of Nature. O trabalho contou com financiamento da FAPESP por meio de um Projeto Temático coordenado por Bastos e de um Bolsa de Doutorado concedida a Jennyfer Mejía, coautora do artigo.

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“Esse artigo é de importância primordial, uma vez que o agente indutor da produção de própolis vermelha pela planta hospedeira foi finalmente identificado. Até então não se tinha qualquer informação sobre qual espécie de inseto poderia estar provocando esse fenômeno”, diz Casari.

A pesquisadora afirma que, com esses dados, será possível expandir os estudos sobre a produção da própolis, que apresenta efeitos importantes na economia devido ao seu alto valor comercial. Em 2019, ano em que o trabalho de campo foi feito, um quilo era vendido por US$ 150.

O artigo A new species of jewel beetle (Coleoptera, Buprestidae, Agrilus) triggers the production of the Brazilian red propolis pode ser lido em: link.springer.com/article/10.1007/s00114-022-01785-x.

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Manejo e novos insumos ajudam a reduzir o uso de fertilizantes minerais na agricultura brasileira

Adoção de práticas mais modernas de cultivo pode gerar economia para os produtores agrícolas de mais de US$ 20 bilhões nas próximas décadas só com a redução do uso de fertilizantes fosfatados, aponta estudo da Esalq-USP

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Elton Alisson | Agência FAPESP – A implementação de estratégias mais sustentáveis de manejo do solo, como o plantio direto com a rotação de culturas e o uso de novos insumos biológicos à base de resíduos orgânicos ou de microrganismos, entre outras soluções, pode ajudar a aumentar a eficiência no aproveitamento e, consequentemente, diminuir o uso de fertilizantes minerais críticos para agricultura brasileira. É o que indicam resultados de estudos apoiados pela FAPESP e conduzidos por pesquisadores ligados a diferentes universidades e instituições de pesquisa no país.

A adoção dessas práticas pode gerar uma economia para os agricultores brasileiros da ordem de mais de US$ 20 bilhões nas próximas décadas só com a redução do uso de fertilizantes fosfatados, estima Paulo Sérgio Pavinato, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).

Nos últimos dez anos, o consumo de fertilizantes fosfatados no Brasil aumentou 43,4% – e mais de 67% são importados de países do norte da África, principalmente do Marrocos.

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“Manter a palha e restos da planta na superfície das lavouras entre as safras, como é feito no plantio direto, e promover a rotação de culturas, explorando o solo o tempo todo e não o deixando desnudo nunca, são formas de promover a ciclagem mais eficiente e aumentar a eficiência no aproveitamento pelas plantas de nutrientes como o fósforo”, diz Pavinato à Agência FAPESP.

De acordo com o pesquisador, fósforo – que é um dos três macronutrientes mais utilizados na adubação de lavouras no Brasil, atrás do nitrogênio e do potássio – é um dos fertilizantes minerais com menores índices de aproveitamento pelas culturas agrícolas nos solos brasileiros.

Isso porque os tipos de solos no Brasil e em outras regiões tropicais, mais argilosos, são ricos em óxidos de ferro e alumínio, que têm capacidade muito alta de se ligar quimicamente e reter fósforo. Dessa forma, grande parte desse fertilizante aplicado fica acumulado no solo em formas pouco ou não acessíveis às plantas.

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“Nos últimos 20 anos, em média, a eficiência no aproveitamento do fósforo pelas plantas cultivadas no Brasil tem sido de 50%”, afirma Pavinato.

“Do total desse fertilizante adicionado na adubação, 50% são extraídos via colheita e os outros 50% restantes ficam retidos no solo. Por isso, é comum aplicar nas lavouras no país pelo menos mais do que o dobro da quantidade de fósforo de que a planta necessita”, explica.

Por meio de um projeto apoiado pela FAPESP, o pesquisador, em colaboração com colegas da Bangor University, do Reino Unido, fez um inventário do fósforo acumulado ou residual nos solos brasileiros a partir dos anos 1970, quando se começou a utilizar fertilizantes em larga escala no país e o mineral passou a ser acumulado no solo.

Os cálculos, baseados em estimativas de adições médias e de retiradas de fósforo pela absorção pelas culturas agrícolas indicaram que, desde os anos 1970, cerca de 33,4 milhões de toneladas do fertilizante foram acumuladas nos solos agrícolas brasileiros.

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As áreas com maior tempo de cultivo, situadas em boa parte do Sudeste, nos Estados de São Paulo, Paraná e Minas Gerais, são as que apresentam os maiores estoques de fósforo no solo, apontaram os pesquisadores em artigo publicado na revista Scientific Reports.

“As regiões com áreas agrícolas mais novas, como as localizadas nos Estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e, mais recentemente, no Matopiba [área considerada a nova fronteira agrícola brasileira, compreendida por porções dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia], têm bem menos fósforo acumulado em função do tempo de cultivo”, diz Pavinato.

“Mas, mesmo nesses Estados, há muito mais fósforo total no solo do que em regiões do Reino Unido, por exemplo”, compara.

Por meio da rotação de culturas, com o plantio de plantas de cobertura, como braquiária ou milheto após o cultivo da soja, por exemplo, é possível não só aumentar a eficiência no uso desse fósforo estocado no solo, como também aumentar a resistência da lavoura à seca, afirma Pavinato.

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Isso porque com a implantação desse sistema as raízes das plantas têm maior capacidade de explorar um volume maior do solo, explica o pesquisador.

“Os produtores com sistema de produção bem implantado, que têm feito a rotação de culturas nos últimos anos, podem passar uma safra ou mais sem precisar adubar suas lavouras porque o solo já tem uma boa reserva de nutrientes, principalmente de fósforo”, diz.

“Já os produtores que seguem o sistema de plantio convencional vão sofrer muito mais em períodos de crise de fertilizantes, como agora, porque não têm reserva no solo”, compara.

Uso de plantas de cobertura

Em um estudo em andamento, também apoiado pela FAPESP, o pesquisador e colaboradores estão avaliando o uso de plantas de cobertura, como ervilhaca, nabo forrageiro, tremoço e azevém no inverno, antes do plantio de milho, no verão, para melhorar a exploração de fósforo no solo.

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Para realizar os experimentos foram aplicados durante sete anos seguidos, entre 2008 e 2015, fosfatos solúvel e natural em áreas de cultivo de milho no Paraná com rotação com essas plantas de cobertura. Após esse período, essas áreas pararam de ser adubadas.

Resultados preliminares do estudo indicaram que, nos anos posteriores e com déficit hídrico, a safra de milho nessas áreas foi duas vezes maior do que a das que não receberam adubação fosfatada.

“As plantas de cobertura que promoveram maior produtividade do milho nessas áreas fosfatadas foram a aveia preta e a azevém. Essas gramíneas têm habilidade de ciclar mais nutrientes de maneira geral. Mas é importante ressaltar que essas respostas só podem ser obtidas em longo prazo”, sublinha Pavinato.

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Fertilizantes organominerais

Um fertilizante organomineral desenvolvido por pesquisadores da Embrapa Solos também pode contribuir tanto para aumentar a disponibilidade de fósforo para cultivares agrícolas como também para aproveitar e gerar valor para um passivo ambiental.

Os pesquisadores da instituição desenvolveram ao longo dos últimos 11 anos um fertilizante organomineral fosfatado granulado a partir da “cama” de frango – material utilizado para forrar o piso dos galpões de granjas, composto por maravalha, palha de arroz, feno de capim e sabugo de milho triturado ou a serragem com as fezes, urina, restos de ração e penas de galinha.

Esse resíduo agrícola era usado como fonte de alimento suplementar para bovinos no Brasil, mas a utilização dele para essa finalidade passou a ser proibida no país a partir de 2004 com o surgimento do “mal da vaca louca”.

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Já na agricultura, o uso desse material é consolidado, porém, sem recomendações técnicas específicas, pondera Joaquim José Frazão, professor do Instituto Federal de Roraima (IFRR).

“A falta de recomendações técnicas específicas tem causado o uso inadequado e aplicação superficial da cama de frango, com doses inadequadas, baixas respostas agronômicas e risco de contaminação do meio ambiente por nitrato, presente em grande quantidade no material”, afirma Frazão.

Uma vez que a cama de frango também apresenta teores variáveis de fósforo, os pesquisadores da Embrapa Solos, em parceria com Frazão, realizaram nos últimos anos diversos testes de misturas do material com fontes minerais a fim de enriquecê-lo com o mineral para aplicação como fertilizante.

Os resultados de testes de aplicação do fertilizante organomineral em casas de vegetação e em campo, nos municípios de Rio Verde e Goiânia, em Goiás, e em Piracicaba, no interior de São Paulo, durante o doutorado de Frazão, com Bolsa da FAPESP, indicaram que o produto tem eficiência agronômica comparável com as fontes minerais tradicionais, como o fosfato monoamônico (MAP) e o superfosfato triplo, já na primeira safra de culturas como a soja e o milho. O estudo foi publicado na revista Sustainability.

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“Também observamos por meio de outros estudos que o produto tem efeito residual no solo”, afirma Frazão.

Como a liberação do fertilizante organomineral é mais lenta em comparação com as outras fontes de fósforo disponíveis, que são solúveis em água, o produto supre a demanda do macronutriente pela planta e, ao mesmo tempo, diminui os riscos de perda do mineral pelo processo de adsorção (fixação) pelos óxidos de ferro e alumínio, explica o pesquisador.

“Como os fertilizantes fosfatados tradicionais são solúveis em água, a liberação deles no solo após a aplicação é quase imediata. Já o organomineral que desenvolvemos tem liberação mais lenta e, dessa forma, é possível mantê-lo disponível no solo por mais tempo”, afirma Frazão.

De acordo com o pesquisador, a Embrapa Solos patenteou a tecnologia do processo de produção do fertilizante organomineral.

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Além da cama de frango, podem ser usadas diversas outras fontes orgânicas para produzir o organomineral, como estercos de aves e bovinos e palha de arroz, ressalta Frazão.

“As respostas de eficiência agronômica do organomineral formulado com essas outras fontes, contudo, podem não ser iguais às do composto por cama de frango em razão da variação da composição química”, pondera.

Fertilizante orgânico à base de lodo do esgoto

Outra fonte promissora para produção de fertilizante é um composto gerado a partir do lodo proveniente do tratamento do esgoto, apontam estudos conduzidos por pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Ilha Solteira.

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Rico em matéria orgânica e fonte de macro e micronutrientes para as plantas, como nitrogênio, fósforo, cobre, ferro, manganês e zinco, o lodo de esgoto já era apontado como um potencial subproduto para aplicação como adubo na agricultura desde a década de 1980. A preocupação com o risco de o resíduo contaminar o solo e as plantas com metais pesados, além de carregar vírus e outros microrganismos patogênicos, porém, limitou a aplicação para essa finalidade, diz Thiago Nogueira, professor da Unesp e coordenador do estudo.

“Mesmo com a comprovação do efeito benéfico do uso do lodo de esgoto na agricultura, as legislações estaduais estabeleceram critérios que dificultaram a aplicação desse resíduo urbano. Uma quantidade muito pequena desse material tem sido usada em larga escala na agricultura não só no Estado de São Paulo, como em outras regiões do país”, afirma Nogueira.

Por meio de uma parceria com uma empresa em Jundiaí, os pesquisadores começaram a fazer a compostagem do lodo de esgoto para eliminar a carga de patógenos e diminuir os teores de metais a fim de viabilizar a aplicação do composto na agricultura.

Os pesquisadores estão avaliando agora o uso do material como fonte orgânica de nutrientes para solos da região do Cerrado, que são naturalmente muito pobres em nitrogênio, fósforo, boro, manganês e zinco, em culturas como arroz, feijão, soja, milho e cana-de-açúcar.

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Resultados preliminares do estudo, realizado no âmbito do mestrado da pesquisadora Adrielle Rodrigues Prates, com bolsa da FAPESP, indicaram que a aplicação do composto aumentou os teores principalmente de cobre, manganês e zinco no solo e nas folhas da cultura da soja.

“Também já observamos um aumento de 67% na produtividade da soja e efeito residual da aplicação do composto com ganhos de produtividade da cultura do milho acima da média nacional e com valores similares aos resultados obtidos somente com a aplicação de fertilizantes minerais”, afirma Nogueira.

Segundo o pesquisador, ficou claro que o composto de lodo de esgoto aumentou a disponibilidade de nutrientes no solo, especialmente nitrogênio, fósforo e alguns micronutrientes, com elevação na produtividade das culturas.

Mais recentemente, outras pesquisas estão sendo desenvolvidas para conhecer melhor a associação de doses do composto de lodo de esgoto com plantas de cobertura cultivadas sob plantio direto no Cerrado, com ênfase no monitoramento da saúde do solo, explica Nogueira.

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Microrganismos solubilizadores

Além do manejo, de variedades melhoradas de plantas e de fertilizantes mais eficientes, outra estratégia que tem sido implementada para melhorar o aproveitamento de nutrientes pelas plantas é a utilização de microrganismos solubilizadores, como bactérias e fungos.

Esses microrganismos têm o potencial de explorar e ajudar as plantas a acessar o fósforo não disponível no solo, por exemplo, explica Antônio Pedro da Rocha Camargo, colaborador do Centro de Pesquisa em Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC) – um Centro de Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído pela FAPESP e pela Embrapa na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“Microrganismos podem ajudar as plantas a conseguir nutrientes de várias formas. Alguns dos mais conhecidos são as micorrizas, que são fungos que se associam à raiz da planta e aumentam a superfície de absorção. Mas também há bactérias que ajudam as plantas a pegar o nutriente que está no solo de uma forma que elas normalmente não conseguem absorver, como o fósforo insolúvel”, explica.

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Durante seu doutorado, realizado com bolsa da FAPESP, o pesquisador investigou microrganismos associados às plantas nos campos rupestres.

Situados na região central do Brasil, os campos rupestres têm solo extremamente pobre em fósforo, em razão das condições geológicas, e muito ácido, mas, ainda assim, apresentam alta diversidade de espécies de plantas, a maior parte delas endêmica (que ocorre exclusivamente naquela região).

“Há anos tem sido estudada a fisiologia dessas plantas com o objetivo de entender como elas crescem naquele bioma”, diz Camargo.

O pesquisador e colaboradores constataram que o solo dos campos rupestres, apesar de muito pobres, também apresenta uma grande diversidade de microrganismos associados às plantas, principalmente bactérias, que também ocorrem exclusivamente naquela região.

Ao analisar esses microrganismos, eles observaram que bactérias encontradas nas proximidades da raiz das plantas apresentam maior número de genes associados à disponibilização de fósforo.

“Vimos que várias funções associadas à disponibilização de fósforo para as plantas estão enriquecidas nessas bactérias”, afirma Camargo.

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Ao comparar o genoma das bactérias dos campos rupestres com o de outras evolutivamente próximas, encontradas em outros lugares, os pesquisadores também constataram que elas possuem mais genes associados à disponibilização de fósforo para as plantas.

“Isso mostra que as funções de disponibilização de fósforo para as plantas provavelmente estão sendo selecionadas naquele ambiente. As plantas podem liberar compostos que são nutritivos para as bactérias que solubilizam fósforo para recrutá-las e, dessa forma, obter o nutriente”, explica Camargo.

O objetivo final do estudo é permitir selecionar e cultivar essas bactérias em larga escala para produzir inóculos – cultura contendo uma ou mais espécies de microrganismo para aplicação em lavouras com o objetivo de aumentar a absorção de fósforo pelas cultivares agrícolas.

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Graduandas do Câmpus de Balsas são aprovadas em seletivos de mestrado da UFMA e da Universidade de São Paulo

Em março, mês da mulher, é tempo de celebrar os avanços das mulheres na ciência: as alunas Luciana Pereira Barbosa e Gilmara Vieira Avanço, dos cursos Engenharia Ambiental e Engenharia Civil do Câmpus Balsas, foram aprovadas em seletivos de pós-graduação na UFMA e na Universidade de São Paulo (USP), para as linhas de pesquisa “Análise e Processamento de Sinais em Petróleo e Novos Combustíveis” e “Engenharia de Estruturas de Concreto e Alvenaria”, respectivamente.

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No caso de Luciana, a conquista vai além da carreira acadêmica e significa uma oportunidade de contribuir para o meio ambiente. “Durante a minha graduação eu me dediquei à pesquisa de energia renovável e, como vemos, o setor energético ainda tem muitos desafios. Hoje temos uma grande necessidade de buscar tecnologias para descarbonização da economia, então, ingressar no programa me dá oportunidade de aprofundar minhas pesquisas e a possibilidade de contribuir para desenvolvimento sustentável do setor”, contou.

A mestranda Gilmara diz que o mestrado é fruto de conquista pessoal e de mulheres de toda a Engenharia: “Graças a Deus e graças às conquistas da mulher no mercado de trabalho, hoje a gente pode dizer que a engenharia tem muitas mulheres atuando, seja na área de projeto, na área de obra ou na área acadêmica. As mulheres estão ganhando força nisso também e realizando um trabalho tão impecável, tão melhor quanto o trabalho de um profissional do sexo masculino”.

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Contudo, os cursos ainda são de maioria masculina. De acordo com dados de 2018 do Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura (Confea), a porcentagem de mulheres registradas como engenheiras no Brasil ainda é 14,5%. As selecionadas contam que a conquista é um esforço compartilhado não só por elas, mas por todas as alunas das engenharias. “Apesar dos discursos de igualdade existentes, nós mulheres ainda enfrentamos muitos desafios. Então eu vejo isso como um grande avanço para todas nós”, disse Luciana.

Saiba mais

O Dia Internacional da Mulher é comemorado no dia 8 de março. A data é uma iniciativa lançada pela Organização das Nações Unidas em 1975 com o objetivo de celebrar conquistas e garantir a plena autonomia e direitos básicos para mulheres de todo o mundo.

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Plataforma web detecta fake news em português de forma automática

Resultados preliminares indicam que o sistema, criado por pesquisadores ligados ao Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria da USP, é capaz de identificar notícias falsas com 96% de precisão

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Elton Alisson | Agência FAPESP – Na atual era de fake news tem sido cada vez mais desafiador distinguir notícias falsas ou falsificadas das reais.

Uma plataforma web criada por pesquisadores ligados ao Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI) pode facilitar essa tarefa.

Por meio de uma combinação de modelos estatísticos e técnicas de aprendizado de máquina, a plataforma é capaz de predizer a probabilidade de um texto ser fake.

Resultados preliminares indicaram que o sistema foi capaz de detectar notícias falsas com 96% de precisão.

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“A ideia da plataforma é oferecer à sociedade uma ferramenta adicional para identificar de forma não somente subjetiva se uma notícia é ou não falsa”, diz à Agência FAPESP Francisco Louzada Neto, diretor de transferência tecnológica do CeMEAI e coordenador do projeto.

Sediado no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC-USP), em São Carlos, o CeMEAI é um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) financiados pela FAPESP.

Características das fake news

Ao receber um texto, que deve conter a notícia completa, o sistema aplica métodos estatísticos para avaliar características de escrita, como palavras usadas ou classes gramaticais mais frequentes.

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Essas caraterísticas são utilizadas por um classificador baseado em um modelo de aprendizado de máquina que é capaz de distinguir padrões de linguagem, vocabulário e semântica de notícias falsas e de verdadeiras e, dessa forma, inferir automaticamente se um texto submetido à plataforma é ou não uma fake news.

“As fake news apresentam padrões na redação do texto, uso e frequência de palavras que podem ser identificáveis pelo classificador”, afirma Louzada.

Para treinar os modelos foi usado um banco de dados construído por pesquisadores da USP, composto por uma grande quantidade de notícias verdadeiras e falsas escritas em português. Além disso, os modelos foram expostos ao vocabulário usado em mais de 100 mil notícias publicadas nos últimos cinco anos.

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A base de notícias serviu de entrada para os modelos estatísticos computacionais empregados na plataforma buscarem automaticamente padrões na redação do texto, como o uso e a frequência das palavras.

“Precisamos sempre atualizar e dar mais subsídios para os modelos usados pela plataforma, de modo a melhorar a acurácia e aumentar a capacidade de predição de fake news”, avalia Louzada.

Os pesquisadores pretendem usar as fake news que circularão nas eleições brasileiras deste ano e as relacionadas à pandemia de COVID-19 para calibrar os modelos.

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“O combate às fake news é uma corrida de gato e rato porque, ao mesmo tempo que tem surgido plataformas como a que desenvolvemos para detectá-las, os métodos para produzir essas notícias falsas também têm sido aprimorados”, avalia Louzada.

Uma das preocupações é que o sistema também possa ser usado por criadores de fake news para avaliar o potencial de uma notícia falsa passar por verdadeira antes de ser difundida.

“Esse é um risco com o qual teremos que lidar”, afirma.

Plataformas para outras aplicações

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A plataforma para detecção de fake news começou a ser desenvolvida por participantes da última edição do Mestrado Profissional em Matemática, Estatística e Computação Aplicadas à Indústria (Mecai), oferecido pelo ICMC-USP e em um dos cursos da área de educação corporativa oferecidos pelo CeMEAI.

Outras soluções desenvolvidas por participantes do curso foram uma plataforma web para antecipação do valor de mercado de criptomoedas e um sistema para acompanhamento de óbitos por COVID-19 em nível municipal.

“Percebemos a dificuldade de acesso aos dados referentes à evolução dos casos e óbitos e de previsão dos números de infectados e mortos em nível municipal em diferentes períodos da pandemia. Com base nessa constatação, a ideia é criar um website que disponibilizará esses dados para cada município do Brasil”, diz Louzada.

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Pesquisadores da USP isolam variante ômicron do SARS-CoV-2

Trabalho permitirá monitorar a disseminação da nova cepa e avaliar a eficácia de vacinas contra a COVID-19 empregadas atualmente no Brasil

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Elton Alisson | Agência FAPESP – Pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) conseguiram isolar a cepa da variante ômicron do SARS-CoV-2. Amostras da variante estão sendo cultivadas em células e, dentro de duas semanas, começarão a ser distribuídas para laboratórios com nível 3 de biossegurança (NB-3) e pesquisadores de todas as regiões do Brasil a fim de ajudar a detectar a disseminação da ômicron pelo país. Além disso, o isolamento da nova cepa permitirá avaliar a eficácia das vacinas contra a nova cepa aplicadas atualmente na população brasileira.

“É a primeira vez que a cepa ômicron é isolada no Brasil”, diz Edison Luiz Durigon, professor do ICB-USP e coordenador do projeto, apoiado pela FAPESP.

A cepa da variante ômicron foi detectada em um casal de brasileiros que mora na África do Sul e que veio ao Brasil a passeio. O casal passou por exames no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, que detectou a infecção pelo coronavírus e encaminhou amostras ao ICB-USP na última quarta-feira (08/12).

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“Essa amostra foi rapidamente sequenciada pelo hospital, que confirmou que era a cepa ômicron. Pegamos essa amostra e colocamos em cultura de célula”, explica Durigon.

O grupo de pesquisadores do ICB-USP também foi o primeiro a conseguir isolar e cultivar em laboratório a cepa original do SARS-CoV-2 que chegou ao Brasil, no final de fevereiro de 2020 (leia mais em https://agencia.fapesp.br/32692/).

Na época, alíquotas do vírus cultivado em laboratório foram distribuídas para grupos de pesquisa e laboratórios clínicos públicos e privados em todo o país e permitiram o desenvolvimento dos primeiros testes diagnósticos de COVID-19 no Brasil e a realização de estudos sobre a doença.

“Agora, estamos preparando alíquotas da cepa ômicron para poder distribuir para laboratórios e grupos de pesquisadores que queiram padronizar novos testes para identificar essa variante rapidamente em outras cidades e Estados”, afirma Durigon.

A previsão é de que no período de duas semanas haverá um estoque suficiente de vírus cultivado para dar início à distribuição pelo país. “Para os laboratórios que estão necessitando com mais urgência, conseguimos enviar algumas alíquotas mais rapidamente”, diz Durigon.

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Neutralização por efeito citopático

O isolamento da cepa original do SARS-CoV-2 e da variante ômicron foi feito por meio de uma técnica de reação de neutralização por efeito citopático, conhecida como VNT, que os pesquisadores do ICB aprimoraram durante a epidemia de zika vírus no Brasil.

“Com a chegada do SARS-CoV-2 ao Brasil, conseguimos isolar o vírus e usá-lo como controle padrão de neutralização”, disse Durigon em palestra no Simpósio sobre a Coronavac, realizado pelo Instituto Butantan e a indústria farmacêutica Sinovac Biotech, produtora do imunizante, entre os dias 7 e 9 de dezembro.

Para isolar o vírus, as amostras clínicas dos pacientes são incubadas em cultura de células Vero e levadas para uma estufa, onde permanecem entre 48 e 72 horas. A partir de 48 horas, os pesquisadores observaram que o SARS-CoV-2 causa mudanças (efeitos citopáticos) bastante características nas células hospedeiras.

“As células ficam bastante arredondadas. Algumas variantes do SARS-CoV-2 causam até sincícios [formação de células multinucleadas por fusão de células uninucleadas ou por muitas divisões celulares incompletas de células]”, afirma Durigon. “Após 72 horas, conseguimos isolar 100% das amostras com relativa facilidade”, diz.

A técnica de neutralização também foi empregada para avaliar a produção de anticorpos neutralizantes no soro ou plasma de convalescentes da COVID-19 (leia mais em https://agencia.fapesp.br/35010/).

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Nesse ensaio, o soro ou o plasma sanguíneo do paciente é diluído de maneira seriada e incubado com quantidades conhecidas do vírus. A mistura de soro e vírus é então transferida para as culturas de células Vero e o efeito citopático do vírus é avaliado depois de 72 horas. O resultado é reportado como a maior diluição do soro capaz de neutralizar o efeito citopático do vírus.

“O plasma de pacientes convalescentes, com altos títulos de anticorpos neutralizantes, ainda é usado hoje no tratamento de pacientes com COVID-19 em estado grave e no tratamento precoce, nos primeiros sete dias de infecção”, explica Durigon

Os pesquisadores também empregaram a técnica VNT para avaliar a quantidade de anticorpos neutralizantes induzidos pela CoronaVac.

Os resultados de dois estudos, com a participação de 580 e 866 indivíduos vacinados com o imunizante, respectivamente, demonstrou que, após a segunda dose, a CoronaVac induz a produção de anticorpos neutralizantes em títulos altos, chegando até 640 para as cepas Wuhan, P1 (gama), P2 (zeta) e delta. Os títulos atingem um pico entre 30 e 60 dias após a segunda dose. Depois há um decaimento, mas ainda são detectáveis até cinco meses após a vacinação, e a memória imunológica perdura.

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“Diferentemente de vacinas que estão sendo usadas para induzir a produção de anticorpos contra a proteína spike – usada pelo SARS-CoV-2 para se conectar com o receptor da célula humana e viabilizar a infecção –, a CoronaVac também induz anticorpos contra a nucleoproteína do vírus. Isso aumenta muito a imunidade geral”, avalia Durigon.

O acompanhamento de alguns pacientes vacinados com a CoronaVac e que contraíram a doença posteriormente também indicou que esses indivíduos, mesmo após seis meses terem recebido a segunda dose da vacina, apresentam resposta muito rápida à infecção, com aumento abrupto dos títulos de anticorpos neutralizantes.

“Essa resposta rápida à infecção permitiu que esses pacientes apresentassem quadros leves da doença. Nenhum deles precisou ser internado”, afirmou Durigon.

A ideia, agora, é avaliar se a variante ômicron é capaz de escapar ou não dos anticorpos de pacientes que receberam as diferentes vacinas aplicadas no país.
 

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