Vontade política que o Passe Livre não encontra

É o Estado como caixa forte do setor privado, um Estado de Bem-Estar Social às avessas, onde o lucro é privatizado e o prejuízo, socializado.

É uma velha conhecida dos brasileiros a lógica perversa que rege o orçamento público: para o povo, o sacrifício; para o empresário, a facilidade. O caso do Passe Livre Estudantil na Grande São Luís é um exemplo clássico dessa distorção, que escancara para quem, de fato, governam certos gestores.

Os números, frios e objetivos, não mentem. Dados apresentados à Câmara Municipal mostram que a implementação do benefício para todos os estudantes da ilha custaria R$ 72 milhões anuais. Um valor expressivo, sem dúvida. Mas a revelação chocante, que deveria causar indignação geral, é que esse montante é inferior aos subsídios anuais que a Prefeitura de São Luís já entrega, rotineiramente, aos donos de empresas de transporte público desde 2022.

Anúncios

A conta é simples, mas a moral por trás dela é complexa e reveladora. Quando se trata de garantir o direito à mobilidade e à educação da juventude, a prefeitura pleiteia restrições, cria embaraços e aponta a suposta falta de recursos. O prefeito Eduardo Braide (PSD) chega ao cúmulo de propor limitar o benefício apenas à sua rede, um cálculo mesquinho que ignora o caráter metropolitano do transporte e o direito de todos os estudantes. A desculpa é a sempre repetida “austeridade fiscal”.

No entanto, para o setor empresarial do transporte, a verba flui com uma facilidade que beira a negligência. O dinheiro público é direcionado para cobrir o “déficit” das empresas, sem o mesmo escrutínio, sem o mesmo drama, sem a mesma exigência de contrapartidas sociais claras. É o Estado como caixa forte do setor privado, um Estado de Bem-Estar Social às avessas, onde o lucro é privatizado e o prejuízo, socializado.

Anúncios

A falta de vontade política, no entanto, vai além das justificativas econômicas. A Câmara de Municipal de São Luís, demonstrando sintonia fina com uma demanda popular, destinou R$ 21 milhões na Lei Orçamentária de 2025 para o fundo de transporte, verba mais que suficiente para custear o passe de 6,5 mil estudantes. A gestão Braide, no entanto, insiste na inércia. É um desrespeito à lei e, sobretudo, à vontade popular, expressa de forma cristalina no plebiscito de 2024, onde quase 90% dos eleitores disseram “sim” ao Passe Livre.

O que vemos aqui é a opção política por um modelo de cidade. De um lado, um modelo que prioriza o subsídio à empresa, perpetuando um sistema de transporte caro e ineficiente, que onera o bolso do trabalhador todos os dias. Do outro, um modelo que investe no cidadão, que enxerga no transporte público um direito social e um vetor de desenvolvimento, garantindo que nossos jovens possam chegar às salas de aula sem que a tarifa seja mais uma barreira à educação.

Anúncios

A experiência de Fortaleza, citada pela comissão especial, prova que é possível. Lá, o custo para atender os estudantes de baixa renda é de R$ 23 milhões/ano. É uma questão de escolha. Enquanto isso, em São Luís, a administração pública parece preferir a submissão aos interesses do setor rodoviário do que a obediência à vontade soberana da população.

O tempo urge. Sem previsão orçamentária, o direito é novamente adiado. E fica a lição: quando a elite econômica pressiona, o cofre público abre com agilidade. Quando o povo clama por um direito básico, a resposta é sempre um “não” disfarçado de complexidade técnica.

Leia outras notícias em cubo.jor.br. Siga o Cubo no BlueSky, Instagram e Threads, também curta nossa página no Facebook e se inscreva em nossos canais, do Telegram e do Youtube. Envie informações e denúncias através do nosso e-mail.

Deixe um comentário

Anúncios
Anúncios
Image of a golden megaphone on an orange background with the text 'Anuncie Aqui' and a Whatsapp contact number.
Anúncios