Quando a gestão Braide apaga a memória de São Luís

O mural de Péricles Rocha, criado em 2001, era um registro do ecossistema marinho local, uma narrativa visual que dialogava com a memória afetiva de São Luís.

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A recente denúncia contra a Prefeitura de São Luís, acusada de destruir um mural do artista Péricles Rocha no Elevado Newton Bello, é a expressão mais clara de um projeto político que enxerga a arte como obstáculo, a história como incômodo e a identidade maranhense como mero detalhe a ser apagado sob pastilhas cerâmicas de uma gestão que prefere o cinza ao colorido da cultura popular. 

O mural de Péricles Rocha, criado em 2001, era um registro do ecossistema marinho local, uma narrativa visual que dialogava com a memória afetiva de São Luís. Sua cobertura, feita sem diálogo com a sociedade, com especialistas ou mesmo com a família do artista, falecido em 2023, revela uma postura autoritária. Não se trata de “revitalização”, mas de apagamento. E quando um governo apaga símbolos culturais, está dizendo, em alto e bom som, que não vê valor no povo que os criou. 

A justificativa de “modernização” esconde outras urgências. O timing é suspeito: em ano eleitoral, com o prefeito Eduardo Braide cotado para disputar o governo do estado, a obra segue a lógica da branding política: substituir o patrimônio coletivo pela estética pasteurizada de uma gestão que prioriza a imagem ao invés do conteúdo. Pior: a falta de transparência nos gastos, com empresas não identificadas no Portal da Transparência, sugere que o dinheiro público pode estar servindo menos à cidade e mais a interesses eleitoreiros. 

Mas o problema vai além desse mural. A denúncia expõe um padrão: a remoção do monumento em homenagem a Gonçalves Dias, o desaparecimento da imagem de São Luís Rei de França, a ausência de editais de fomento para artistas locais em meio a verbas milionárias da Secretaria de Cultura. Enquanto festivais contratam nomes nacionais com cachês altíssimos, os criadores maranhenses são relegados a palcos secundários, com pouca divulgação e menos ainda reconhecimento. Não é que o público “não curta” os artistas locais, é que o poder público os trata como figurantes, não como protagonistas. 

O resultado é a erosão programada da cultura maranhense. Se o bumba meu boi, as ladainhas, a literatura de Josué Montello ou os traços de Péricles Rocha não forem defendidos com políticas públicas consistentes, São Luís corre o risco de se tornar mais uma cidade genérica, onde o passado é demolido e o futuro é uma cópia mal feita e genética do que há de mais raso no Brasil. 

A pergunta que fica é: quem tem o direito de decidir o que merece ou não ser lembrado? Quando um prefeito, ou qualquer gestor, age como dono da memória coletiva, ele não está administrando. Está impondo. E uma cidade que perde sua arte perde, também, sua alma. O Ministério Público deve investigar, a sociedade deve cobrar, e os movimentos culturais precisam resistir. Porque cultura não é enfeite. É resistência.

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